sábado, 29 de setembro de 2007

A terrível verdade



O príncipe encantado não existe, é um mito. Aquele homem que aparece montado num cavalo branco e nos tira da torre onde nos fechamos à chave pela mágoa é um mentiroso.

Estou absolutamente convicta de que se formos à procura da Branca de Neve, da Rapunzel e da Bela Adormecida, vamos encontrar a Branca de Neve a viver outra vez com os Sete Anões, a Rapunzel divorciada porque rapou o cabelo e ele não reparou e a Bela Adormecida a chorar ao pé das fadas madrinhas porque o príncipe Filipe chegou outra vez a casa com batom no colarinho.

Minhas amigas, quanto mais depressa aceitarmos este facto, menos desilusões teremos: os homens são todos iguais. O homem que repara no que temos vestido (e que levámos horas a escolher para ele), o homem que sabe compreender os nossos silêncios e o nosso olhar cansado, o homem que nos vê a nós e só a nós, apesar da loira boazona que passa ao lado, o homem que nos abraça porque nos quer abraçar e não porque nos quer foder, o homem que não nos desilude, o homem que vem sempre salvar-nos não existe. Não existe, percebem? O príncipe encantado não existe, são todos sapos. Convençam-se disso. Eu já me convenci.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Memórias de infância


Sou pequenina (dizem que nunca fui pequenina, que sempre fui grande para a idade, mas sou pequenina) e tenho de esticar o bracinho para agarrar o dedo do meu avô e de mexer depressa as minhas perninhas curtas (curtas ao pé das dele, porque dizem que sempre as tive compridas) para acompanhar os seus passos largos. Com a sua paciência interminável de avô, leva-me, como faz todos os dias, ao parque infantil para me empurrar o baloiço durante tanto tempo quanto a minha inconsciênca de criança quiser. Inconsciência porque não percebo que lhe doem os joelhos e as costas por estar em pé e o braço por me empurrar. Sou criança e sou egoísta e digo-lhe "Mais, avô! Mais!", e apesar das dores ele continua, porque ao fim do dia vou sentar-me no seu colo, pôr-lhe os braços à volta do pescoço e dizer "Adoro-te avô." e porque no dia seguinte vou fazer na escola um desenho para lhe dar, que ele vai guardar na gaveta onde guarda todas as coisas que lhe dou, desprovidas de qualquer valor material. Mas mesmo que não fizesse nada disso, ele continuaria a empurrar o baloiço, em pé, ao sol, suportaria as dores e o calor porque o seu coração se enchia de alegria a cada gargalhada minha.

A saudade significa que um dia estivemos perto, e a felicidade também se encontra em memórias, que podemos reviver vezes sem conta, recordando ou inventando um novo detalhe de cada vez que um desses momentos perdidos algures no tempo nos vêm à memória e nos preenchem o coração.

domingo, 16 de setembro de 2007



Estou no limbo, à espera de uma luz, de um sinal que me guie, porque não consigo ver. Não me consigo mexer, não sei onde estou, tenho frio e quero ir para casa. Foi quando fugi a correr sem olhar para trás que me perdi assim, de ti, do mundo, de mim. E agora que não sei onde estou grito por ti, mas tu já não me consegues ouvir. Não me consegues ouvir, não porque não me queiras ouvir, mas porque não podes, porque a única pessoa que consegue ouvir os meus gritos sou eu, apenas eu sinto a pele a rasgar, as gotas de sangue a percorrer o meu corpo, a dor interminável de não saber quem sou.

Sentada no chão, com frio e sem ver um palmo à frente do nariz, tenho de ganhar equilíbrio próprio para me levantar e força própria para caminhar.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Manhãs



Manhãs cheias de sol, em que os raios de luz entram pela janela e banham o corpo descansado da noite de esperança.

Manhãs em que ao despertar se revive um sonho delicioso que depois se escapa da memória, mas deixa a doce felicidade da ilusão.

Manhãs em que, assim que se liga o rádio, passa aquela música que nos deixa a cantar o dia todo.

Manhãs de sumo de laranja e torradas.

Manhãs de grandes planos e expectativas, de sonhos e ansiedade, de saudade e coração preenchido ao mesmo tempo.

Momentos de felicidade que nos proporcionam as pequenas coisas da vida ...