sábado, 21 de julho de 2007

Eu



Sinto-me presa, neste lugar cheio de sol e cheiro a mar, sinto-me melancólica. Sei que não quero estar aqui, nem voltar atrás, por isso assumo que só possa seguir em frente. Mas para onde? E como? Não tenho para onde ir, não quero que me levem daqui, mas também não quero ficar. Quero voar, soltar-me das cordas que me prendem os pulsos e os tornozelos e ser livre, voar para um lugar com príncipes encantados, livros, nuvens de algodão doce, sol e mar. Quero paz.

Não sei onde estou. Não compreendo esta melancolia, esta tristeza, esta quase obrigação de respirar. Não me conheço ou reconheço, ouço uma voz que não é a minha; quem é esta pessoa, afinal? Será que morri e nasceu outro eu dentro de mim? E que toda esta melancolia, esta tristeza, este peso que o oxigénio me provoca no peito, esta impassividade de viver, não passa do luto do eu por mim? Será que me perdi e encontrei alguém, não melhor, mas capacitada para viver e ser quem sou ou quem tenho de ser? Alguém cheia de sonhos e ideias, de maturidade e garra, de coragem e vida? E será que, se for dormir e te encontrar e a tua serenidade tomar conta de mim, como sempre fazia, vou acordar e ver um novo lugar, aqui mesmo, com os pés bem assentes na terra, cheio de príncipes encantados, livros, nuvens de algodão doce, sol e mar? Talvez seja apenas um sonho, mas acredito que o luto por quem já não sou vai dar lugar ao que sempre quis ser.
(Pequeno pormenor: a fotografia foi tirada por mim, em Porto Côvo)

quinta-feira, 31 de maio de 2007

Sopro de um sonho


Já não acredito em ti. Já nem sequer acredito na tua existência. Se alguma vez exististe foi dentro de mim, enquanto objecto da minha criação. A pessoa para quem olho agora não és tu. És tu para ti e para os outros. Para mim não. Mas a culpa é minha. Menti-me e enganei-me e ceguei-me, tudo por vontade própria, porque era mais fácil assim. Afinal, para quê abrir os olhos e viver a preto e branco se os posso fechar e viver em colorido? É certo que de olhos fechados vou tropeçando pelo caminho, mas para quem tem essência de sonhador é assim mesmo. E é melhor assim. Os sonhos, esses ninguém os pode levar. Já o resto... a pouco e pouco levaste tudo, não ficou quase nada. Deixaste apenas o último sopro do sonho daquilo que foi. Porque foi isso mesmo que foi, um sonho. Agora acordo devagar, quero lembrar-me do que sonhei e não sou capaz. Vêm-me rasgos de momentos à memória. Momentos que vivi a sonhar.

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Ausência



Hoje sei o significado de ausência.

Ausência não é não estar presente, ausência não é estar distante, porque quando não se está presente pode-se estar lá, e quando se está distante pode-se estar perto, de outras formas. Os estados físicos pouco importam. Estamos tão distantes quanto nos sentimos e a presença traduz-se em estados de espírito.

Ausência é quando estavas aqui e o teu coração noutro lugar. Quando eu falava e tu não ouvias. Quando sentia o teu corpo, mas não a tua alma. E a tua ausência pesou. E ausentei-me também. Passámos então a ser dois corpos que respiravam o mesmo ar e trocavam afectos mecânicos. E os teus afectos mecânicos destruíam-me por dentro. E corrompemo-nos um ao outro. E rasguei a tua pele, tu rasgaste a minha. E arrancaste-me o coração, eu arranquei o teu. E a frieza dominou tudo. E destruímo-nos.

Agora que não estas presente, sinto-te perto, tão perto... mas agora é tarde.

sábado, 5 de maio de 2007

O teu adeus



Se fechar os olhos, ainda consigo sentir o calor da tua pele, a textura do teu cabelo, o teu cheiro. E ainda consigo sentir o sabor das tuas lágrimas quando te beijei e dissemos adeus.

Nunca pensei que fosse possível encontrar alguém tão como eu quanto tu consegues ser; alguém que sabe exactamente aquilo que quero dizer e não digo, que adivinha aquelas palavras que me morrem entre o coração e a boca; alguém capaz de caminhar a meu lado, com os olhos postos no mesmo horizonte; alguém capaz de me compreender, completamente; alguém que me enche o coração de calor, apenas com a voz.

Não tem um nome aquilo que és na minha vida, não precisa de ter e não faria sentido se tivesse. É suficiente para mim a forma como me olhas, não preciso de ter mais certeza nenhuma para além da que me das quando estas presente. Sim, encho-me de dúvidas quando não estas e não sei se amar-te aos bocadinhos é suficiente, mas vivi o hoje podendo amar-te e sei que disso não me arrependo. Não sei quando chegará o amanhã em que vou poder voltar a fazê-lo, se é que vai chegar, porque tudo é incerto (são cada vez menos as certezas, e de que servem elas se um dia chegarei à conclusão de que estava errada?), mas foi bom escapar de tudo o resto, contigo, hoje.

Um adeus significa que um dia se esteve perto e é isso que interessa, é isso que fica na memória para reviver vezes sem conta.

quarta-feira, 2 de maio de 2007

O fim


É quando as coisas partem que sentimos a sua falta. A ideia do "nunca mais" assola-nos a alma e vêm-nos à memória todos os momentos que deixamos passar em que não dissemos ou fizemos o que queríamos ter dito ou feito e apercebemo-nos que se tornou tarde demais. Os maus momentos apagam-se, como se nunca tivessem existido (porque quando as coisas chegam ao fim nunca nos lembramos do que tinham de mau), e invadem-nos o espírito aqueles em que fomos felizes e aos quais não soubemos dar o devido valor na devida altura.

Porquê, perguntamo-nos, porquê? Porque nada é eterno, porque tudo há-de chegar ao fim. E o fim, chegue ele como chegar, há-de ser sempre doloroso e imprevisível.

O mundo acaba, desistimos, morremos por dentro. E, depois da chuva passar, renascemos. Das cinzas nasce um novo mundo, construído à luz dos erros que cometemos no outro; um novo mundo que também há-de chegar ao fim para dar lugar a outro, por necessidade de mudança.

É quando acaba a água que temos sede, é quando não chove que nos apercebemos da falta que a chuva nos faz e foi só quando partiste que compreendi o quanto ainda precisava de ti.